Quando
no ano de 1747, o cidadão Irlandês John Beare, transferiu de Coina (Barreiro)
para a
Marinha
Grande, a Real Fábrica de Vidros, certamente nunca lhe passou pela cabeça, que
iria
Contribuir,
para a criação de um dos maiores bastiões das lutas operárias em Portugal.
A Marinha Grande é uma cidade, que foi primeiro de
lenhadores, depois de vidreiros. Ao contrário de outras cidades e vilas de
Portugal, que nasceram e cresceram à volta de uma igreja ou castelo, a Marinha
Grande cresceu e desenvolveu-se em redor de uma fábrica de vidros.
Foi com Guilherme Stephens, que adquiriu a empresa em
1769, que começou o desenvolvimento do vidro na Marinha Grande, embora o seu
apogeu se tivesse dado nos finais do século XIX princípios do século XX.
Em 1920, estavam em laboração na Marinha Grande, dez
fábricas de vidro, quatro em construção e uma projectada.
Hoje a realidade é bem diferente
Para se poder analisar os números da crise que têm
atingido o sector vidreiro, no subsector da cristalaria, apresento de seguida
alguns dados para reflexão.
Nas décadas de 70 e 80, trabalhavam no sector cerca de
4000 trabalhadores. Só a Ivima, antes da crise de 1985/1986, tinha 1400
empregados.
Entre 1992 e 2006 encerraram 14 empresas de produção
de vidro, entre elas a M.P.Roldão, empresa emblemática das lutas operárias e a
Marividros, empresa onde trabalhei 18 anos. Foram cerca de 2160 postos de
trabalho que se perderam, são inúmeros os casos em que esta situação atingiu
famílias inteiras.
A própria Real Fábrica de Vidros, que a partir
de 1954, tinha mudado o seu nome para F.E.I.S. foi encerrada por decisão do
Conselho de Ministros em 15 de Maio de 1992. Era então Primeiro-ministro, o
actual Presidente da Republica, Aníbal Cavaco Silva.
A Marinha Grande, jamais lhe irá perdoar! …
Com o encerramento da Fábrica Escola Irmãos Stephens,
a Marinha Grande ficou órfão de pai e mãe. Este sentimento não é só meu, é o
sentimento de milhares de Marinhenses, ou dos que não sendo Marinhenses, grupo
onde eu próprio me incluo, foram adoptados por esta maravilhosa terra.
Sou
um filho adoptivo desta terra, mas tenho um enorme orgulho pela sua história,
pelo seu passado e presente de luta.
Deixo
também algumas partes do discurso, que o Camarada Álvaro Cunhal , proferiu no
dia 18 de Janeiro de 1975 na Marinha Grande.
“
Fiéis ao legado dos operários vidreiros que em 18 de Janeiro de 1934, pela sua
acção heróica escreveram uma das mais importantes páginas da luta dos
trabalhadores portugueses contra o fascismo, sucessivas gerações de marinhenses
deram, com a sua luta perseverante, uma inestimável contribuição para que o
povo português, derrubada a ditadura em 25 de Abril de 1974, pudesse finalmente
viver em liberdade.
A
classe operária e o povo da Marinha Grande pagaram um pesado tributo pelo seu
espírito indomável, pela sua fidelidade à causa dos revolucionários do 18 de
Janeiro, pelo seu apego à liberdade e ao socialismo.
«Marinha
Grande é um nome escrito a ouro na história do movimento operário português.
Melhor se pode dizer: escrito com lágrimas e sangue.
Porque
a luta dos trabalhadores da Marinha Grande ao longo de 50 anos de fascismo foi
paga com pesadas perdas, com perseguições, torturas, prisões, com o assassínio
e a deportação de muitos dos seus melhores filhos, com séculos passados nas
masmorras fascistas por muitos anos, com privações e sacrifícios silenciosos e
anónimos das famílias dos militantes, educadas na mesma escola de elevada
consciência de classe e incansável combatividade.
As
tradições de luta do proletariado da Marinha Grande são inseparáveis da
actividade dos comunistas. A classe forjou a sua vanguarda revolucionária – a
vanguarda revolucionária (os comunistas) soube estar à altura da classe.”
(Do discurso de Álvaro Cunhal no comício do PCP, a 18
de Janeiro de 1975, na Marinha Grande, nas primeiras comemorações do 18 de
Janeiro, em liberdade).
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